Wilson da Costa Bueno*
Tem sido cada vez mais comum observar empresas e entidades se apropriando do conceito de Responsabilidade Social para dar suporte a ações confessadamente comerciais, onde o único interesse é obter lucros à custa da boa fé de consumidores e cidadãos em geral. No último Natal, mais do que em qualquer outra época, multiplicaram-se os exemplos de fabricantes e lojas que, para vender produtos, insistiram na história de que, a cada compra, 1 real seria doado para uma entidade filantrópica. Sem prestação de contas, sem nada, na mais deslavada e pura enganação.
Agora, pelo menos uma universidade resolveu valer-se do nobre conceito para recrutar alunos, num mercado onde a concorrência é acirrada e nem sempre a ética é o atributo mais destacado. Basta acompanhar as seguidas intervenções do MEC para disciplinar a área, com cursos irregulares, diplomas que nada valem, MBAs fantasmas e pós-graduações que não levam a título algum.
A UNIBAN, usando o Pelé como garoto propaganda, está com uma campanha no ar que proclama a sua Responsabilidade Social. Na prática, a sua ação cidadã consiste em reduzir as mensalidades para os novos alunos. Uma jogada de marketing, de gosto discutível, porque se confunde com a imagem já desgatada de instituições de ensino que fazem qualquer coisa para conseguir alunos, lotam salas de aula, contratam professores sem titulação, abrem mão de um processo de seleção realmente sério e dão, efetivamente, pouca atenção ao ensino, que deveria ser o seu objetivo maior.
Em princípio, não está em discussão a qualidade do ensino da UNIBAN, mesmo porque isso não nos cabe e não é o escopo deste comentário. Além disso, seria injusto focalizar uma instituição em particular (mas dá para consultar os seus resultados no Provão, conversar com alunos e professores, verificar se tem criado cursos de maneira irregular ou se há diplomas por ela emitidos que nada valem, notar se tem fechado turmas e cursos depois de iniciados, prejudicando os alunos etc) porque o ensino, como um todo, com raras exceções, anda de mal a pior nesse País, que considera a educação como despesa e não como investimento. Dá até para verificar junto à OAB a porcentagem de seus alunos de Direito aprovados no exame da Ordem e por aí vai. A principal responsabilidade social de uma instituição de ensino é a educação com qualidade, prestação de serviços à comunidade e pesquisa. Talvez a gente pudesse imaginar que a UNIBAN deveria usar estes conceitos em sua campanha de vestibular, mas aí o Pelé e a redução de mensalidades seriam de pronto descartados. Ou não?
O que nos preocupa é o uso (na verdade, o abuso) do conceito de Responsabilidade Social, o que configura, no mínimo, uma afronta, já que, como nos ensina o Instituto Ethos, ele passa longe desta visão mercantilista, desta apropriação indébita feita pela UNIBAN.
É preciso admitir também que a associação do conceito de Responsabilidade Social com celebridades como Pelé, o maior atleta do século, é espúria porque o Brasil inteiro sabe que, na vida pessoal o sr. Edson Arantes do Nascimento andou cometendo alguns deslizes graves, como o de não reconhecer sua filha legítima, além de emitir conceitos tolos em Política e ser envolvido em alguns negócios (por culpa dele ou não) que não primaram pela ética e a boa gestão. Não dá para aceitar que, sob este aspecto, o Pelé seja um exemplo de responsabilidade social, mas para a UNIBAN, em sua visão equivocada do conceito, o que vale é aumentar os lucros, que já são enormes.
Há informações, ainda não confirmadas (esperamos a manifestação de professores da UNIBAN, cuja fonte , evidentemente, preservaremos) de que a contrapartida à redução das mensalidades seria a redução de seus salários e salas cada vez mais cheias. Se for verdade (preferimos não apostar nisso porque seria um crime ao ensino e não, apenas um uso inadequado do conceito), então o problema é mais grave porque implicaria em “dar com uma mão e tirar com a outra, ou fazer caridade com o bolso dos outros, o que, convenhamos, está distante, muito distante, da prática cidadã , que é que o que se espera das organizações modernas.
De qualquer forma, é preciso repudiar a campanha equivocada que apenas reforça a tese de que a comunicação das organizações precisa se profissionalizar, privilegiar a ética e a transparência. Se a qualidade do ensino é adequada, os alunos, os professores e o mercado que os incorpora se incumbirão de fazer a boa divulgação. Pelé divulga vitaminas, é garoto propaganda de um laboratório que vende medicamentos contra a disfunção erétil, anuncia celular e assim por diante. Algum dia, algumas instituições de ensino irão perceber a diferença entre educação e produtos de consumo e , quando isso acontecer, talvez estejam em condições de entender o verdadeiro conceito de Responsabilidade Social. A comunicação da UNIBAN precisa freqüentar o colégio. Pelo jeito, parece que andou cabulando as aulas.