Wilson da Costa Bueno*
É estranho, muito estranho. Um banco, que se chama Unibanco, está tentando, numa campanha que beira ao cinismo empresarial, convencer as pessoas de que "nem parece banco".
A leitura que se pode fazer do mote da campanha é que o Unibanco gostaria de não ser visto como tal, certamente porque reconhece que parecer banco não é lá muito boa coisa. Deve ter razão, convenhamos, já que, no Brasil, a imagem dos bancos (vamos esquecer pesquisas feitas por determinados institutos e prêmios encomendados porque a melhor pesquisa , nesse caso, é perguntar diretamente ao correntista dos bancos!) é pouco favorável mesmo. Mas não faz sentido. Ou faz sentido?
Mas será que alguém acredita nisso? Basta ver os lucros fabulosos das instituições financeiras enquanto os salários , em geral, declinam ou examinar o aumento abusivo das taxas bancárias , mesmo quando o cliente, por sua conta, via Internet Banking, faz todas as operações. O que dizer dos juros extorsivos, da segurança precária (que muitas vezes só serve para barrar pessoas honestas nas portas giratórias) e da discriminação contra segmentos da população brasileira (apesar da presença dos negros nas campanhas publicitárias, eles continuam sendo minoria e ganham menos do que os brancos nestas instituições voltadas exclusivamente para o lucro fácil)?
O Unibanco é um banco, como todos os outros bancos. Tem até banco no nome (está no DNA dele!), de tal modo que vai ficar difícil esquecer que , no fundo, ele quer mesmo, como os outros, o nosso dinheiro. Lembra-se da campanha anterior, mais cínica do que essa: o casal-propaganda do banco vendia a idéia de que a gente deveria gastar menos, quando estava ali exatamente para nos convencer do contrário. O banco lucra uma fábula com os empréstimos diretos ao consumidor. Para que ele possa consumir mais e se endividar mais. Apenas um dado recente: no primeiro semestre de 2005, o lucro dos bancos cresceu mais de 37% em comparação ao mesmo período do ano anterior e "foi resultado do lucro com tarifas e crédito e com a valorização do real, que resultou em ganhos expressivos do Bradesco e do Unibanco, com operações no mercado futuro" (Vieira, Enio. Lucro dos bancos cresceu 37% no primeiro semestre. O Globo, 03/09/2005, p.27 )
Você se recorda do ataque dos bancos (muitos deles) ao dinheiro (pobre dinheirinho!) do aposentados? Todo mundo querendo emprestar dinheiro a eles (os bancos são generosos nessa hora!) com a garantia de desconto em folha, sem riscos? Você sabia que os bancos penalizam a todos nós com juros altos com a desculpa de que todos têm que pagar pela inadimplência dos maus pagadores? Você conhece a história de alguém que sempre deu lucro aos bancos ser por eles abandonado quando está passando por dificuldades?
Acho que não só você, mas o pessoal do Unibanco desconfia (deveria ter certeza) de que a gente sabe de tudo isso . Mas, certamente, eles querem faturar com a imagem ruim que eles mesmo criaram. Estranho, não?
A criatividade das agências muitas vezes escorrega por terrenos pantanosos e se respalda na tese equivocada de que os correntistas e os cidadãos não são inteligentes e de que é possível, com figurinhas animadas, desvinculá-los da realidade. A lógica é essa: a gente passa desenho animado e o telespectador (correntista atual ou potencial, pensam eles, já que não se interessam mesmo por um telespectador qualquer) imagina que é ficção, historinha de criança, brincadeirinha. Deve ser mesmo: banco generoso é uma ficção daquelas!
Talvez seja razoável perguntar aos brasileiros o que acham de um banco que não parece banco, e que parece gostaria de ser, como sua propaganda, uma geléia geral, o mundo da carochinha. Quando a gente estiver precisando de um banco ( cuidado, muito cuidado nessas horas), talvez não deva procurar o Unibanco porque ele não gosta de ser banco. Tem vergonha de ser um. Ou quer se disfarçar de chapeuzinho vermelho para que a gente não perceba a cara do lobo. Fica a sugestão para a agência do Unibanco: na próxima campanha, assine apenas Uni. Assim, talvez os mais desavisados não percebam que existe um banco (igual a todos os outros) aí atrás.
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* Wilson da Costa Bueno é jornalista, professor
do programa de Pós-Graduação em Comunicação
Social da UMESP e de Jornalismo da ECA/USP, diretor da Comtexto
Comunicação e Pesquisa.