Miguel Jorge*
As corporações
estão passando por fantásticas transformações
nas últimas duas décadas, num processo que
continuará nos próximos anos, com conseqüências
ainda imprevisíveis, tal a velocidade e a natureza
das mudanças.
O impacto da Revolução
da Informação já redesenha as empresas
e o universo dos negócios, mas está apenas
começando – quem poderia imaginar, por exemplo,
que uma empresa virtual pudesse chegar a valer bilhões
de dólares e muito mais do que companhias tradicionais,
com fábricas, maquinários, equipamentos de
ponta e milhares de empregados?
A revolução
tecnológica, particularmente a Internet, determinará
o fracasso ou o sucesso de empresas e negócios, mudará
a estrutura dos mercados, o comportamento dos consumidores
e as relações trabalho-capital. Com o tempo,
vai impactar toda a vida social, os valores, a política
e a cultura.
Apesar de toda essa
revolução, a tecnologia, cada vez mais acessível
em qualquer parte do planeta, costuma colocar as empresas
num mesmo patamar, sem grandes diferenciais e sem abismos
em relação às vantagens competitivas.
Em determinados momentos,
companhias criadoras lucram com as inovações
que introduzem no mercado, com mudanças significativas
introduzidas no processo de produção ou com
um sistema de gestão revolucionário. Mas,
hoje, rapidamente, essas inovações são
disseminadas e compartilhadas pelas demais corporações.
Observem, por exemplo,
os carros mundiais – são cada vez mais iguais,
com design parecido, com os mesmos dispositivos tecnológicos
ou qualidade do processo produtivo, independentemente do
País onde são fabricados. O consumidor médio
também não consegue ve grandes diferenças
entre várias marcas de tevês, geladeiras, videocassetes,
liquidificadores ou computadores.
Em boa parte dos casos,
o diferencial ainda é o preço.
Nesse novo cenário,
quais serão as vantagens competitivas de uma empresa
ou de uma marca?
Os publicitários
são os únicos com uma resposta na ponta da
língua. Para eles, diferenciais ou vantagens competitivas
não precisam ter ligação com o mundo
real, pois elas podem ser puramente subjetivas e conceituais.
Ou não teriam
como mostrar as vantagens de uma marca de cigarro entre
dezenas de outras, com os mesmos teores de nicotina e alcatrão
e o mesmo potencial para provocar câncer no pulmão
ou apressar um infarto.
Da mesma forma, as marcas
agregam certos valores que não são medidos
pelos custos de produção, mas pelo que eles
representam para o consumidor em termos de prestígio,
status e exclusividade.
Mas, cada vez mais,
o consumidor, em particular, e a sociedade, como um todo,
estão impondo novas exigências às empresas,
o que estabelece outros parâmetros para se determinar
as vantagens competitivas de uma corporação
ou de uma marca.
Primeiro, a sociedade está consciente de que os
grandes conglomerados, principalmente a partir da chamada
globalização, adquiriram uma enorme força
e participação na vida das nações.
Em muitos casos, mostram-se mais poderosos do que estados
nacionais.
Em 1997, as 100 maiores
companhias do mundo tiveram receita bruta que excedia o
PIB de 50% dos países – o faturamento da GM
foi igual ao PIB da Áustria.
No ano passado, o faturamento
da AT&T foi quase 50% superior ao PIB da Hungria. As
vendas da GE suplantaram o PIB da Colômbia.
Hoje, o valor de mercado
de algumas das empresas da chamada nova economia, mesmo
com as recentes e violentas quedas das ações
na Nasdaq, não está muito distante do PIB
do Brasil, uma das 10 maiores economias do mundo e mais
de 160 milhões de habitantes.
No Brasil, o faturamento
anual da VW equivale aos PIBs somados do Amapá, Acre
e Piauí.
Em contraposição
ao poder de fogo dos grandes grupos, a humanidade enfrenta
realidades dramáticas, como o fato de que 1,3 bilhão
de pessoas sobrevivem com um dólar ou menos por dia.
Ou com a constatação
de que um grupo de minguados 350 bilionários detêm
a mesma riqueza que a renda de quase 50% da população
mais pobre do Planeta.
Mais: há 600
milhões de crianças fora das salas de aula
e mais de um bilhão de analfabetos em todo o mundo.
Diante desse cenário,
a sociedade começa a entender que, tanto quanto os
governos nacionais ou os organismos internacionais, as empresas
são também responsáveis pela transformação
social.
Assim, deve ser cobrada
delas uma atuação socialmente responsável
na proporção de sua riqueza e de seu poder
de ação – e na proporção
daquilo que recebem da sociedade.
Outro aspecto importante:
assim como o capital privado expandiu-se, exercendo impacto
sobre as economias e a vida das pessoas, os governos nacionais
perderam força e restringiram sua área de
atuação, abrindo mão, por exemplo,
do papel de empresário que costumava exercer em boa
parte dos países.
Mais que isso, declaram-se
impotentes para resolver problemas que competem a eles resolver.
E não estamos
falando apenas do Terceiro Mundo.
Há quatro anos,
convocadas pelo presidente Bill Clinton e por ex-presidentes
dos Estados Unidos, as maiores corporações
da nação mais rica do mundo juntaram-se para
formar um fundo e somar suas experiências empresariais
com o objetivo de ajudar o governo a reduzir a pobreza de
40 milhões de pessoas e combater a violência
e o narcotráfico. O governo, segundo Clinton, não
tinha recursos para enfrentar esses problemas. Além
disso, precisava da experiência gerencial da iniciativa
privada para dar mais eficiência e racionalidade aos
programas sociais do governo.
No Brasil, as empresas
também estão sendo convocadas pelos governos
para estabelecer parcerias que visem atenuar os problemas
sociais.
Um das mais bem-sucedidas,
por exemplo, é o Programa Comunidade Solidária,
e particularmente o Alfabetização Solidária,
tocado pelo governo federal com a parceria de centenas de
universidades e empresas, entre elas a Volkswagen.
Iniciativas do gênero
espalham-se pelos estados e municípios, com um acelerado
aumento da participação da iniciativa privada
em programas sociais.
Hoje, os programas mais
eficientes para reduzir a repetência e evasão
escolar e complementar a escola pública são
de responsabilidade de organizações não-governamentais,
geralmente com o apoio de empresas privadas.
Da mesma forma, a produção
cultural do País e, como destaque o ressurgimento
do cinema brasileiro, está se fortalecendo com o
patrocínio das empresas, com ou sem incentivos fiscais.
O que concluir de tudo
isso?
A constatação
mais óbvia é a de que a sociedade não
mais encara a empresa como um mero fabricante de produto
ou prestador de serviços que atende às suas
necessidades imediatas e gera empregos.
Ela quer saber como
a empresa fabrica seus produtos; se usa ou não mão-de-obra
infantil; se emprega pesticidas que degradam o meio ambiente
ou se desenvolve ações e programas para protegê-lo;
se discrimina ou valoriza as mulheres e as minorias; se,
de fato, está contribuindo para reduzir os desequilíbrios
sociais.
Com a conscientização
e a mobilização crescentes da sociedade pela
defesa de seus direitos de cidadania, em várias partes
do mundo, aumenta a cobrança sobre as empresas.
Exatamente nesse momento,
aumenta também a responsabilidade de uma comunicação
empresarial excelente e moderna.
O professor americano
James Grunig, da Universidade de Maryland, especialista
em comunicação empresarial, fez uma extensa
pesquisa entre as maiores empresas dos Estados Unidos, Canadá
e Reino Unido para descobrir que aspectos determinam a excelência
do gerenciamento da comunicação empresarial.
Em seu livro "Excellence
in Public Relations and Communication Management",
aponta 12 características que definem a excelência
da comunicação de uma empresa. Algumas são
extremamente óbvias e valem para todos os setores
da empresa, como a necessidade de recursos humanos competentes,
de uma estrutura orgânica e de lideranças.
Mas ele inclui outras
qualidades que só tiveram reconhecimento na última
década, mesmo em países mais desenvolvidos.
Uma delas é a
responsabilidade social, ou como as empresas administram
o negócio com os olhos voltados para os efeitos que
suas decisões possam provocar na sociedade.
O professor, que esteve
no Brasil em março, concluiu que a excelência
empresarial, incluindo a excelência de sua comunicação
com os diversos públicos, não está
desvinculada do comportamento social da empresa, da forma
com que ela se envolve nas questões sociais ou de
seu comprometimento com as causas sociais mais amplas.
Outra característica
que Grunig observou na empresas bem-sucedidas é o
apoio às mulheres e às minorias. Ele constatou
que as organizações que têm uma comunicação
excelente – e são excelentes nos outros setores
– reconhecem o valor da diversidade, empregando mulheres,
deficientes físicos e minorias e permitindo seu acesso
a cargos de decisão.
Antes, esse tipo de
decisão empresarial tinha a ver com paternalismo,
assistencialismo ou com os princípio cristão
da caridade. Hoje, é exercício da responsabilidade
social.
Mas é também
um diferencial estratégico do negócio e pode
constituir-se em vantagem comparativa.
Outro aspecto político
também é relevante. Com o fracasso das economias
centralizadas e planificadas e a derrocada de ditaduras
em todo o mundo, a democracia fortalece a sociedade e os
setores organizados, que passam a exercer pressão
sobre governos e corporações.
Antes vistas com desconfiança
e descrédito, as organizações não-governamentais
tornaram-se parceiras das empresas e dos governos na busca
de soluções para os problemas enfrentados
pela humanidade.
Tudo isso está
redefinindo as novas vantagens competitivas das empresas.
Cada vez mais, elas se diferenciarão uma das outras
pela postura ética em suas relações
com o mercado, com os diversos públicos e com a comunidade
de um modo geral. Dentro desses novos paradigmas, crescerão
mais as empresas que souberem atender às expectativas
e necessidades mais amplas da sociedade.
Grandes economistas
sempre afirmaram que a responsabilidade de um negócio
é maximizar o lucro de seus acionistas. Não
erraram, porque, assim procedendo, as empresas cresceram,
atraíram capital e criaram riqueza e desenvolvimento.
Hoje, porém,
isso não basta para garantir o sucesso de um empreendimento.
Cada vez mais, funcionários, fornecedores, clientes
e a comunidade estão sendo vistos como sócios
do negócio, contribuindo para o crescimento das corporações
e compartilhando seus resultados. Além de produtos
e serviços de qualidade e preços justos, as
corporações têm de apresentar valores
éticos.
No Brasil, ainda estamos
engatilhando nesse caminho. Mas, cada vez mais, o lucro
e o sucesso das empresas nacionais dependerão, não
só de suas competências essenciais, de tecnologias
avançadas, de suas formas de gestão e da confiança
dos acionistas, mas, também de como elas se comportam
socialmente.
Responsabilidade social
ou cidadania corporativa pode ser traduzida como coerência
ética nas ações e relações
com os diferentes públicos e com a sociedade de um
modo geral.
As empresas estão
conscientes disso, o que se comprova pelo crescimento contín
uo no número de filiações a ONGs, como
Council on Economy Priorities Accreditation Agency, que
reúne empresas, universidades e organizações
não-governamentais com o objetivo de difundir a responsabilidade
social entre empresas de todo o mundo.
O Business for Social
Responsibility, com sede na Califórnia, já
tem mais de 1.500 empresas filiadas, as quais somam patrimônio
global superior a US$ 1 trilhão.
Ao visitar o Brasil,
ano passado, Robert Dunn, presidente do Business for Social
Responsability, declarou que a responsabilidade social das
empresas é tão importante e determinante quanto
a qualidade, a tecnologia e a capacidade de inovação,
com poder para atrair consumidores e gerar vendas e lucros
para os acionistas.
Dunn informou que mais
de dois terços dos consumidores americanos já
preferem produtos desenvolvidos pelas corporações
socialmente responsáveis. Empresas brasileiras, como
a Natura e o Boticário, têm uma legião
de fiel consumidores atraídos por esses valores.
No Brasil, foram criados
o Instituto Ethos e o Instituto da Cidadania, com os mesmos
propósitos. Há mais tempo, a Fundação
Abrinq, que, inicialmente reunia os fabricantes de brinquedos
e hoje tem associados de vários setores, atua não
apenas para estabelecer princípios e comportamentos
éticos para seus afiliados, como também para
interferir na realidade social.
Empresários que
aderem a essas instituições ou que investem
cada vez mais no social sabem que o mercado internacional
se fechará progressivamente para empresas e produtos
que agridem o meio ambiente, exploram mão-de-obra
infantil, direta ou indiretamente, em qualquer ponto da
cadeia produtiva, ou que não respeitam os direitos
do consumidor.
As legislações
tornam-se mais rígidas e os países mobilizam-se
para criar selos especiais para obrigar as empresas a cumprir
suas obrigações sociais.
Já existe a Norma
ISO 8000 (BVQI), para certificar as empresas éticas,
assim como se certificam a qualidade do processo (ISO 9000)
e a gestão ambiental (ISO 14000).
Países ricos,
como os Estados Unidos, insistem na criação
de selos sociais, embora, em parte, esta seja uma manobra
política para excluir da competição
mundial países que não respeitam direitos
trabalhistas, usam mão-de-obra infantil ou agridem
o meio ambiente.
A atual comunicação
empresarial deve ter a real perspectiva dessas transformações,
que redesenham seus conceitos, sua filosofia e suas práticas.
Mais que nunca, as empresas serão reconhecidas pelos
valores, pela cultura, pela história que carregam
consigo.
E o desafio da comunicação
empresarial é agregar esses valores à marca
e aos produtos. Ela contribui para a eficácia organizacional
e corporativa quando ajuda a conciliar os objetivos da empresa
com as expectativas de seus públicos estratégicos.
Assim, embora a comunicação
empresarial também seja vista como poderoso instrumento
de marketing – e o é, de fato --, sua função
maior é construir uma imagem positiva das corporações
e marcas, capitalizando as qualidades intrínsecas
dos produtos e serviços e, principalmente, os valores
e os relacionamentos com os diversos públicos.
Essa contribuição
tem também um valor monetário para a organização.
Pesquisas junto äs
maiores corporações americanas mostram que,
geralmente, os executivos de comunicação dão
um retorno para as empresas de 186% sobre os investimentos
feitos na área. Para as empresas com excelentes programas
de comunicação, o retorno é de 225%.
Uma comunicação
empresarial excelente reduz gastos com possíveis
litígios, pressões da comunidade e eventuais
regulamentações que trariam ônus para
a empresa, além, claro, de gerar uma exposição
positiva. Por isso, ela é considerada um importante
e indispensável instrumento para administração
de crises.
As empresas socialmente
responsáveis têm valores incorporados à
marca e aos produtos; ganham reputação, respeito
social, clientes fiéis e têm melhor retorno
financeiro.
São as empresas
que oferecem oportunidade iguais para todos, protegem o
meio ambiente, têm programas voltados para a comunidade,
preocupam-se com a educação e com a qualidade
de vida dos cidadãos e defendem a promoção
dos Direitos Humanos.
Outras pesquisas mostram
que as empresas que exercem a cidadania corporativa e a
responsabilidade social têm melhores resultados financeiros.
Uma delas, da Universidade de Harvard, revela que crescem
quatro vezes maior que as focadas nos acionistas.
Em 1997, o Business
for Social Responsability ouviu 2.100 estudantes americanos
de MBA e constatou que as empresas-cidadãs atraem
melhores profissionais, mesmo oferecendo salários
menores.
No caminho inverso,
grandes corporações tiveram prejuízos
financeiros ou à sua imagem devido ao seu comportamento
ou de seus fornecedores.
Robert Dunn cita o exemplo
de uma empresa produtora de cimento que foi expulsa de uma
cidade norte-americana por pressão da comunidade.
Sem um trabalho de respeito ao meio ambiente e de relações
com a comunidade, seus custos cresceram e sua competitividade
desapareceu.
Empresas como a Nike
e a Benetton tiveram sérios problemas com as denúncias
de exploração de mão-de-obra infantil
por seus fornecedores asiáticos.
Mas devemos ressaltar
que cidadania corporativa não é marketing,
embora produza resultados nesse sentido. Antes de tudo,
é uma mudança de mentalidade, de cultura,
em sintonia com as aspirações e expectativas
da sociedade.
Encarar ações
sociais ou valores éticos com mero marketing é
trair o conceito de empresa-cidadã, o que, certamente,
cedo ou tarde, trará conseqüências justamente
inversas ao que se pretende.
Assumindo suas responsabilidades
sociais, as companhias se humanizam e ganham alma.
No atual cenário
de competitividade cada vez maior, a comunicação
é instrumento indispensável para expor a empresa,
seus produtos e seus serviços.
Até o fim da
década de 80, apenas as grandes empresas tinham um
departamento de comunicação – geralmente,
uma gerência de Imprensa ou de Relações
Públicas. Hoje, espalha-se o reconhecimento da importância
da comunicação empresarial e até pequenas
empresas sentem que precisam de um trabalho de comunicação
para aparecer no mercado, trabalhar em estratégias
de negócios etc. Pessoas físicas, como jogadores
de futebol, artistas, consultores de moda, cirurgiões
etc, usam empresas de comunicação.
Em muitos casos, a sobrevivência
de um negócio depende tanto da eficiência da
comunicação quanto de suas competências
essenciais.
Não menos importante
do que a simples divulgação de produtos ou
serviços, a comunicação é poderosa
ferramenta para a empresa dialogar com a sociedade, dar
satisfação de seus atos e conhecer expectativas
e instrumento fundamental para construir e solidificar a
imagem empresarial.
Muitas vezes, a imagem
corporativa ou de uma marca transcende as próprias
características do produto. Em várias partes
do mundo, o McDonald’s tem uma poderosa imagem institucional,
não apenas por causa do sanduíche, da batata
frita ou de seu logotipo vermelho e amarelo.
Mais que fast-food,
o McDonald’s vende conceitos, que têm a ver
com sua história, com seu sucesso empresarial, com
sua forma de gestão, com sua maneira de atender o
consumidor, com a limpeza de suas instalações
e com o serviço rápido.
Ou seja: a imagem corporativa
do McDonald’s não é o Big Mac, mas o
conjunto de valores que incorporou ao longo de décadas
e é seu maior patrimônio.
A avidez com que a população
de países comunistas, anos atrás, formou imensas
filas na porta da lanchonete – e o McDonald’s
instalou-se em Moscou antes da perestroika e da glasnost
- tem menos a ver com carne do hambúrguer que com
a mudança comportamental introduzida pelo McDonald’s.
Da mesma forma, um carro
da Volkswagen incorpora muito mais que injeção
eletrônica ou inovações tecnológicas
também presentes em outros veículos nacionais.
A imagem da marca liga-se a características objetivas
dos veículos e, também, com outras, não
mensuráveis, mas que fazem parte da percepção
do consumidor, como robustez, economia e durabilidade.
A imagem tem a ver,
também, com a história da companhia no País,
com suas relações com seus empregados, seus
fornecedore, com a comunidade e com os valores que incorpora
ao longo da existência. Tem a ver, por exemplo, com
o fato de, durante décadas, ter sido a maior empresa
privada e a maior empregadora do País – ainda
é a maior empregadora do setor industrial. Ou por
ter sido pioneira em programas sociais: há 25 anos,
criou uma escola de 1º e 2º graus para empregados
e um centro de formação profissional, dentro
de uma fábrica. Nessa época, ninguém
falava de responsabilidade social das empresas.
Foi ainda, uma das primeiras
a apoiar a produção cultural do País,
envolvendo-se profundamente com o setor.
A trajetória
de uma empresa e seu comportamento ético ao longo
do tempo são fatores importantes para a formação
de uma marca ou para o reconhecimento de uma companhia pela
opinião pública, especialmente para os formadores
de opinião.
Anos atrás, um
grande empreiteiro perguntou-me como sua construtora poderia
sair dos jornais, onde só aparecia em denúncias
de obras públicas superfaturadas ou de licitações
viciadas.
Respondi que, primeiro,
era preciso parar com essas práticas.
Como já esperava,
ele respondeu que era impossível, pois essas eram
as regras do jogo - como governos nunca pagam nos prazos
estabelecidos, as empreiteiras são obrigadas a aumentar
os preços para compensar os custos financeiros dos
atrasos.
Expliquei que, embora
poderosas, as ferramentas de comunicação não
transformam água em vinho. A empresa não poderia
projetar para a população uma imagem contrária
ä sua realidade.
Mas como uma corporação
ética e responsável pode ser reconhecida?
Como isso se dá, na prática?
Com uma política
de comunicação clara e definida e reconhecida
como fator estratégico para o sucesso da corporação,
da marca e do produto.
A princípio,
pode parecer fácil implantar uma política
de comunicação numa empresa. Mas não
basta definir princípios e traçar estratégias.
Criar e implantar uma
política de comunicação é uma
tarefa árdua – antes de tudo, e quase sempre,
é preciso mudar mentalidades e a própria cultura
da empresa, não apenas da alta direção,
mas, principalmente, da média gerência.
Imagine-se uma empresa
como a Volkswagen, com cerca de 400 diretores, gerentes
e supervisores, pessoas que, de alguma forma, controlam
as informações em suas áreas. Em muitos
casos, sentem-se donas das informações ou
inseguras por terem de compartilhá-lhas. Ainda há
o medo de que a divulgação possa prejudicá-las.
No oposto, outros entendem
que informação é poder e querem usá-la
para atender a seus projetos pessoais, mais do que aos interesses
corporativos.
Essas mentalidades têm
que mudar para que os funcionários, em todos os níveis,
entendam a importância da comunicação
para a empresa. É preciso haver a consciência
de que a informação tem valor estratégico
para empresa e faz parte do negócio.
Um engenheiro, por exemplo,
precisa saber que não perde tempo e nem é
menos produtivo quando fica duas horas numa entrevista.
A comunicação
empresarial deve integrar e coordenar todas as funções
e atividades inerentes. Ela não deve subordinar-se
a outras áreas, como Marketing, RH ou Financeiro,
como acontece em em algumas empresas, não só
no Brasil, como nos Estados Unidos e em outros países.
Subordinada a outros departamentos, fica praticamente impossível
administrar a comunicação de forma estratégica.
Além disso, a
área precisa de poder político e de decisão
dentro da corporação. Na Volkswagen, faz parte
da Vice-Presidência de Assuntos Corporativos, que
tem assento na diretoria-executiva da Companhia.A comunicação
empresarial deve interagir com todas as demais áreas
da corporação, trabalhando com estratégias
corporativas mais amplas, o que fica absolutamente claro
na administração de crises.
Muitas vezes, a companhia
tem de tomar uma decisão para resolver confrontos
com a opinião pública, embora isso possa prejudicar
as vendas (portanto, contra as metas imediatas do Marketing)
ou o resultado financeiro (contra as metas de Financeiro).
Quando a Johnson&Jonhson
descobriu que o Tylenol estava contaminado por uma ação
criminosa, retirou imediatamente 32 milhões de caixas
do medicamento espalhadas pelos Estados Unidos, perdendo
milhões de dólares. Na época, alguns
argumentaram, inclusive na Johnson, que a empresa se precipitara
e tomara uma decisão drástica, antes de saber
a extensão do problema (já tinham morrido
sete pessoas em Chicago).
Mas com essa decisão
e pelo fato de a empresa ter agido com total transparência,
competência e eficácia na comunicação,
o Tylenol voltou ao mercado, recuperou a confiança
do consumidor e vende muito bem até hoje.
Se a empresa tivesse
agido de outra forma, provavelmente o Tylenol teria desaparecido,
com enormes prejuízos financeiros e de imagem para
a empresa. Mas, ao contrário, uma comunicação
rápida, transparente e precisa consolidou sua imagem
de corporação séria e confiável.
A política de
comunicação de uma empresa deve ser norteada
por alguns princípios e o principal deles é
a consciência do dever de informar à sociedade
sobre suas atividades. A corporação precisa
respeitar o direito democrático e universal à
informação.
Por isso, deve exercer
a transparência. A sociedade tem direito à
informação e as ações de comunicaão
empresarial, para o público interno ou externo, visam
informar e esclarecer.
Para os mais novos,
isso pode soar como uma obviedade. Mas todos aqueles que
vivenciaram os anos de chumbo dos governos militares sabem
como foi duro convencer as empresas sobre seu dever de informar
seus públicos.
Naquela época
de censura e de medo, era difícil ter informações,
mesmo as mais prosaicas, sobre os governos e as estatais.
As siderúrgicas, por exemplo, não sentiam-se
obrigadas a informar o público, embora fossem estatais
financiadas por dinheiro público, tirado do bolso
do contribuinte.
Por sua vez, o clima
de censura contaminou as empresas privadas que, por conveniência
ou medo, também achavam que não deviam satisfações
à sociedade.
Se havia uma greve,
a empresa simplesmente negava a paralisação,
apesar de todas as evidências. Na maioria dos casos,
falava-se com a sociedade por notas e comunicados oficiais,
que diziam apenas o que lhes interessava.
A imprensa, por sua
vez, numa linha de resistência política, pouco
se interessava pelos negócios das empresas, principalmente
multinacionais, que chegavam a ser hostilizadas por parte
da midia, fenômeno era reforçado por uma economia
fechada e um regime político de desrespeito às
liberdades individuais e coletivas.
O noticiário
econômico dos jornais, espremido entre outras editorias,
era anêmico e, normalmente, dominado por declarações
oficiais. Não havia o chamado jornalismo econômico
ou de negócios de hoje.
Neste cenário,
as áreas de comunicação das empresas
limitavam-se a atender eventuais demandas de jornalistas.
Com raras exceções, as empresas não
tinham uma postura pró-ativa, com a preocupação
de divulgar suas atividades e nem não havia a noção
da importância da comunicação como instrumento
estratégico de gestão.
De certa forma, a comunicação
refletia o tipo de capitalismo esquisito em que vivíamos,
com um alto grau de interferência do Estado na economia,
reserva de mercado e falta de verdadeira concorrência.
O mundo mudou, o Brasil
reconquistou a democracia, o País e a imprensa se
modernizaram. As corporações também
mudaram ou estão mudando.
Principalmente a partir
da abertura da economia, no início dos anos 90, os
jornais e as revistas – e mesmo a televisão
e as emissoras de rádio – começaram
a dar destaque para o noticiário econômico
e de negócios, criando cadernos, colunas econômicas
e seções e editorias, como a de informática.
Algumas publicações
até já criaram a editoria de Nova Economia,
para destacar as atividades das empresas digitais, de alta
tecnologia e de biotecnologia.
Ao mesmo tempo, o mercado
editorial tem lançado um sem-número de publicações
especializadas e segmentadas nas áreas de economia
e de negócios, também cada vez mais presentes
em serviços de newsletters e de broadcasting e em
sites na Internet.
Surgiram, ainda, muito
mais jornalistas especializados e bem-preparados para a
cobertura de economia e negócios.
Além disso, a
imprensa, retomada a democracia, tornou-se mais crítica,
mais inquisidora e mais investigativa. Em muitos casos,
concentra o papel de polícia, promotor, juiz e carrasco.
Obviamente, isso é
uma distorção, mas as empresas têm de
conviver com essa realidade e, sobretudo, administrá-la
– o que torna ainda mais necessárfia uma comunicação
empresarial excelente.
Como a imprensa, a comunicação
corporativa passa por profundas transformações
para adaptar-se a esse cenário e ganhar vantagens
competitivas.
Hoje, as empresas sabem
que informar não é apenas um dever, mas um
fator estratégico para o sucesso de seus negócios
e a conquista da opinião pública.
No recente caso da Ambev,
empresas, tradicionalmente discretas e avessas à
confrontação, travaram uma batalha pelos meios
de comunicação para expor seus pontos de vistas
e defender seus interesses, com legitimidade, e, às
vezes, até com virulência. Além dos
interesses empresariais em jogo, estava também o
interesse da sociedade em conhecer todas as implicações
que a fusão teria no mercado.
O menor ou maior grau
de transparência na oferta de informações
ao público determina, também, o sucesso e
a eficácia da comunicação empresarial
e da própria empresa. É muito simples: a transparência
é uma evidência de que a empresa nada tem a
esconder, cumpre suas funções sociais, está
em dia com suas obrigações.
Centenas de empresas
ou marcas perderam a credibilidade por falta de transparência
de seus gestores, principalmente em situações
de crise.
Ao mesmo tempo, é
cada vez maior o número de empresas que abandonam
sua atuação low profile para comunicar-se
mais com os diversos públicos.
Na Volkswagen, segue-se
esse princípio - sem dúvida, é a montadora
que disponibiliza o maior número de informações
à imprensa. Seus principais executivos não
apenas são autorizados, mas incentivados a falar
sobre as atividades e novidades de suas áreas.
Restrições
à divulgação, só em raras situações.
Uma delas, claro, quando a informação comprometeria
uma estratégia da empresa, como o lançamento
de um novo produto, desenvolvido em sigilo. Também
não se fala sobre processos que estão sub
judice.
Na maior parte dos casos,
procura-se atender a todas as demandas e assumir uma postura
pró-ativa, buscando divulgar ao máximo as
ações da companhia.
Nota-se uma profissionalização
e um amadurecimento crescentes no relacionamento entre os
jornalistas e as empresas, em decorrência das transformações
por que passa a sociedade brasileira.
Há poucos anos,
ainda havia resistências e desconfianças de
ambas as partes, justamente por não entenderam que
tinham, pelo menos, um cliente em comum: o público
consumidor de informações.
Um e outro, jornalistas
e executivos das empresas, precisam atender às necessidades
e exigências de informação desse público.
A empresa é um cliente do jornalista, que precisa
de suas informações para transmiti-las a seu
público. Por outro lado, o jornalista é um
cliente da empresa, a quem compete transmitir as informações
que julga relevantes para seu consumidor.
É uma parceria
de mão dupla.
As empresas fornecem
informações sobre suas atividades produtivas,
seus processos de gestão, sua contribuição
social e mesmo suas opiniões sobre o mercado, sobre
políticas do governo ou assuntos nacionais importantes.
Com isso, ajuda o jornalista a informar seu público.
A imprensa, embora seu
compromisso seja com o leitor, também ajuda a empresa
quando noticia suas iniciativas com imparcialidade e isenção.
Isso torna a empresa mais conhecida, mais exposta aos olhos
do consumidor, dá a ela a oportunidade de expressar
seus pontos de vistas e mostrar seus produtos e serviços.
O dever de informar
beneficia a sociedade, a imprensa e as empresas.
As corporações
têm direito de defender seus pontos de vista, seus
direitos e seus interesses. E esse é um ponto importante
na comunicação empresarial.
As empresas são
seres vivos, pois vivem de relacionamentos.
Por sua importância
na vida social, freqüentemente são questionadas
sobre suas ações e seu impacto sobre a sociedade,
o que as obriga a explicar a razão de seus atos.
Tanto no trabalho de
divulgação das ações da empresa,
quanto na administração de eventuais crises,
das quais as empresas não estão loivres, deve-se
levar em conta o que alguns hoje chamam de "capital
de comunicação".
Trata-se de elementos
ou componentes da história da empresa que agregam
valor às suas marcas, a seus produtos e à
sua imagem, e que criam uma insuperável vantagem
competitiva.
Muitas empresas beneficiaram-se
de sua história e de seu patrimônio moral diante
de crises.
A opinião pública
entendeu as explicações da Levi’s, conhecida
por sua ética corporativa, quando demitiu parte de
seus empregados. Para os consumidores, a Levi’s não
conseguiu evitar as demissões e continuava respeitada
por seu comportamento ético no mercado.
Vítima de uma
fatalidade, a TAM conseguiu recuperar-se porque tinha uma
espécie de "crédito" à sua
imagem de empresa que procura respeitar o cliente, fortemente
baseada no conceito de excelente serviço, simbolizado
pelo tapete vermelho e pelo presidente da companhia na escada
do avião, cumprimentando cada passageiro.
Essa boa imagem ajudou-a
a enfrentar uma das mais terríveis crises que uma
companhia aérea pode enfrentar, e que resultou na
morte de 99 passageiros. Apesar dos inúmeros problemas
criados por uma crise dessas proporções, pouco
meses depois, a TAM foi escolhida a melhor empresa do ano.
Em várias pesquisas, aparece como a mais admirada
pelos executivos brasileiros.
Deve-se ressaltar ainda
a amplitude do trabalho de comunicação nas
empresas.
Um dos desafios é
ocupar o maior espaço possível, principalmente
os mais nobres, que garantem audiência, dão
prestígio e reforçam a reputação
da empresa, abrir ao máximo as oportunidades de a
empresa falar com a opinião pública.
Até aqui, falamos
dos princípios básicos e dos valores que devem
nortear a comunicação corporativa.
Mas é importante
salientar como as novas tecnologias, principalmente a Internet,
estão mudando o relacionamento entre a empresas e
seus diferentes públicos e, portanto, afetando o
trabalho dos profissionais de comunicação.
Certamente, a Internet mudará também o relacionamento
entre as empresas e a mídia.
Até agora, a
intermediação entre empresa e sociedade vem
sendo feita pelos meios tradicionais de comunicação,
como o jornal, a revista, o rádio e a televisão.
As informações que saem da empresa passam
pelo crivo das redações, que as selecionam
e editam antes de chegarem ao consumidor.
Esse processo existe
também na Internet, onde os sites de notícias,
ligados ou não aos grupos que controlam os veículos
tradicionais, também selecionam e editam as informações.
Mas, agora, as empresas
já têm outros canais para levar suas informações
aos consumidores e à sociedade, sem intermediários.
Além disso, haverá
uma nítida transferência de poder para as mãos
do usuário ou consumidor, que terá uma infinidade
de opções para obter, selecionar e editar,
ele mesmo, as informações de seu interesse.
Isso exigirá
da empresa maior objetividade e ainda mais transparência
nas informações ao consumidor, em particular,
e à sociedade, em geral, e aumentará a vigilância
da sociedade sobre as corporações.
Com a ponta dos dedos,
o cidadão percorre o mundo, comparando produtos e
preços, pesquisando alternativas para suas necessidades
ou buscando novos pontos de vistas sobre questões
cruciais.
Em poucos minutos, o
consumidor verá como atua uma empresa em outra nação
– ficará sabendo, por exemplo, que uma empresa
conceituada em seu país explora mão-de-obra
infantil em um país asiático ou derruba árvores
nos trópicos. Saberá que determinado alimento
é transgênico e está sendo questionado
em vários cantos do planeta.
Antes, o consumidor
dependia exclusivamente do trabalho da imprensa e das informações
das empresas, e da forma com que um e outro trabalhava e
selecionava e editava essa informação.
Agora, e cada vez mais,
terá mais ricas fontes de informação.
Num conflito, por exemplo,
todas as partes podem colocar seus pontos de vista na Internet.
Os chiapas mexicanos e os guerrilheiros de Kosovo já
fazem isso.
Muda a relação
entre a empresa como fonte de informação,
como muda a dinâmica. Para a comunicação
empresarial, a Internet rompe com o chamado expediente comercial
e o cartão de ponto.
Mesmo no domingo ou
feriado, o jornalista consultará uma assessoria de
imprensa virtual e fará o download de fotografias
ou ilustrações para usar na edição
do dia seguinte, sem precisar falar com ninguém.
Qualquer um plugado
que esteja plugado à Internet tem acesso às
mesmas informações, no mesmo momento em que
entram nos sites.
O feedback com os diferentes
públicos da comunicação empresarial
também fica mais rápido e, em certos casos,
instantâneo.
Institutos de pesquisa
e as próprias empresas aperfeiçoam mecanismos
para aferir, de pronto, o comportamento, as preferências
e expectativas do consumidor. Outras tecnologias –
mais uma vez, a Internet na ponta – permitem um contato
mais estreito entre cliente, comerciantes e produtores.
Outras tecnologias,
como a TV a cabo e por satélite, também mudam
conteúdos, segmentando as audiências e exigindo
novos planejamentos de mídia. Com seu fortalecimento,
as corporações podem definir seus públicos
com mais precisão, usando linguagem diferenciadas.
Com isso, ganhará mais eficiência e, certamente,
reduzirá custos.
Com a rapidez permitida
pelos cabos, satélites e fibras óticas, e
o novo ambiente criado pela Internet, a tecnologia permitirá
cada vez mais que a empresa entre na casa do cliente, sem
intermediários. E vice-versa: cada vez mais, o cliente
terá condições de penetrar no universo
da corporação.
Além de mais
transparência, a Internet exigirá mais agilidade
das empresas na comunicação com seus diversos
públicos.
Antes, uma entrevista
de um executivo seria publicada no dia seguinte. Hoje, pouco
minutos depois, ela já está nos sites, serviços
on line e de broadcasting das empresas jornalísticas,
repercutindo quase que imediatamente.
A Internet propõe
mais um desafio: como a empresa pode aumentar sua visibilidade
num cenário tão competitivo de informações?
Não temos uma
resposta segura para essa pergunta, dada a velocidade vertiginosa
com que as transformações se processam e ao
fato de, até certo ponto, estarmos ainda aturdidos
e despreparados diante da nova tecnologia.
Com raras exceções,
as assessorias de imprensa ainda usam timidamente as ferramentas
da Internet, não por resistirem de forma conservadora
a uma nova tecnologia, mas por não conseguirem acompanhar
as mudanças ou não estarem preparadas para
isso.
A organização
desse seminário solicitou que eu falasse também
sobre os limites entre informação e marketing,
uma questão bastante oportuna.
Para os meios de comunicação,
é saudável e importante existir um limite
entre informação jornalística, marketing
e propaganda. O maior compromisso da imprensa, embora isso
possa parecer uma utopia, é veicular a informação
isenta, não subordinada a outros interesses que não
o de esclarecer os fatos.
Mas esses limites não
estão tão rígidos assim, denunciam
jornalistas sérios dos Estados Unidos, ao falarem
dos vícios da imprensa de seu país.
Segundo eles, as grandes
empresas jornalísticas abriram demais o leque de
seus negócios, aumentando sua participação
em outros segmentos, e isso pode estar comprometendo a isenção
do noticiário de seus veículos de comunicação.
Muitos especialistas
dizem que os grandes jornais só sobreviverão
se tiverem outros negócios, como na área de
telecomunicações ou na indústria de
entretenimento. Mas surgem algumas perguntas cruciais:
Como esses jornais manterão
a isenção ao falar desses setores? Quando
estarão de fato fornecendo uma informação
relevante ou quando estarão fazendo marketing?
Críticos ferozes
dessa situação, como o jornalista James Fallows,
autor do polêmico "Detonando a notícia
– Como a mídia corrói a democracia americana",
preocupam-se, entre outros aspectos, com a crescente aproximação
do jornalismo e do marketing.
No jornalismo, essa
é uma questão polêmica e complexa. No
caso das empresas não ligadas à área
de comunicação, talvez não seja tão
complicada por elas não serem um meio de comunicação.
Mas há alguns
aspectos interessantes a comentar, mesmo porque houve uma
mudança significativa na forma de se pensar a comunicação
empresarial e no perfil do profissional de comunicação
das empresas.
Até poucos anos,
o assessor de imprensa tradicional deveria ser um jornalista,
com passagem por redações de jornais, que
soubesse traduzir as notícias da empresa em linguagem
jornalística.
Jornalistas de formação,
os assessores de imprensa tinham verdadeiro pavor das áreas
de marketing. Consideravam sua obrigação apenas
trabalhar a imagem das empresas e não vender produtos,
tentando, assim, reproduzir nas corporações
os limites entre redação e publicidade observadols
em algumas empresas jornalísticas.
Essa visão denotava
certa arrogância, pois presumia a atividade jornalística
mais nobre que a dos marqueteiros.
Essa questão
é tipicamente brasileira e resultado de uma soma
de equívocos conceituais, legais, culturais e corporativos.
A confusão foi
legalizada pela exigência do diploma de jornalismo
para o exercício profissional e pela equiparação
das assessorias de imprensa às empresas jornalísticas
por dois decretos de 1979.
Com isso, assessores
de imprensa ganharam status de jornalistas, com as mesmas
prerrogativas legais e direitos trabalhistas, inclusive
a esdrúxula jornada de cinco horas de trabalho, outro
ineditismo nacional. A reunião dos profissionais
numa mesma categoria sindical sacramentou a confusão.
Há componentes
psicológicos na discussão. Recrutados para
as assessorias, os jornalistas mantinham a pose, as conquistas
legais e o título, que dava prestígio a uma
atividade até pouco tempo considerada menos nobre
entre os profissionais da área. Assessor de imprensa
tinha até um caráter pejorativo entre os "coleguinhas".
A discussão é
mais que oportuna, pois, em 1998, o Tribunal Superior do
Trabalho sentenciou que "assessor de imprensa não
exerce atividades típicas de jornalismo, pois o desempenho
dessa função não compreende a busca
de informações para redação
de notícias e artigos, organização,
orientação e direção de trabalhos
jornalísticos".
Pela sentença,
o assessor de imprensa "atua como simples divulgador
de notícia e mero repassador de informações
aos jornalistas, servindo apenas de intermediário
entre o seu empregador e a imprensa". Curiosidade:
na sentença, o TST indeferia ação de
uma assessora de imprensa que pleiteava o direito à
jornada de cinco horas.
Goste-se ou não,
a decisão do TST – que, estranhamente, não
teve a menor repercussão na categoria – remete
ao verdadeiro centro da questão: assessoria de imprensa
é atividade jornalística?
Imprensa e comunicação
empresarial têm natureza, objetivos e interesses diversos.
A missão da imprensa é democratizar a informação,
representar os interesses da sociedade, fiscalizar o Estado
e proteger os cidadãos contra o arbítrio,
a opressão e as injustiças praticadas pelo
Estado, por autoridades públicas, instituições,
grupos econômicos e interesses privados.
O objetivo principal
da comunicação empresarial é defender
os interesses da companhia ou instituição
e zelar por sua boa imagem. Em miúdos: o primeiro
compromisso do profissional da imprensa é com o leitor;
o do profissional da comunicação empresarial,
com o cliente.
Ambos exercem atividades
diferentes - já se disse até são como
dois trilhos paralelos, que nunca se juntam.
Não há
dúvida, porém, de que o profissional com formação,
experiência e aptidões jornalísticas
é talhado para exercer a assessoria de imprensa,
razão pela qual empresas, brasileiras ou de outros
países, sempre recrutaram jornalistas para a atividade.
Jornalista e assessor
falam a mesma linguagem, dominam o mesmo jargão,
conhecem as boas técnicas jornalísticas e
sabem o que quer o leitor. Mas seus interesses são
diversos.
Pela experiência
de outros países, o assessor de imprensa não
precisa, necessariamente, ser um jornalista. Mas o profissional
de comunicação empresarial está mudando
de perfil, e, qualquer que seja sua origem, precisa atender
às novas necessidades da área, que exige conhecimentos
mais amplos de marketing e promoção de vendas
e relações públicas, por exemplo.
Assessoria de imprensa
precisa somar um pouco de todas essas áreas.
Como já comentado,
até pouco tempo atrás, assessores de imprensa
relutavam em aceitar, por exemplo, que seu trabalho visava,
entre outras coisas, vender produtos e serviços da
companhia.
Hoje, a assessoria de
imprensa é um dos mais importantes serviços
de apoio ao marketing e à promoção
de vendas.
Isso, e a profissionalização
dos dois lados do balcão, fez com que a comunicação
empresarial e seus profissionais ganhassem credibilidade,
respeito e nova identidade.
Hoje, os bons profissionais
entendem que a comunicação empresarial é
muito mais complexa e exige a interação absoluta
entre as várias áreas de uma companhia.
Entendem que a divulgação
jornalística é uma poderosa ferramenta de
apoio ao marketing das empresas e, ao mesmo tempo, reconhecem
o marketing como um elemento fundamental de construção
da imagem institucional de uma corporação
ou de uma marca.
Para o profissional
de comunicação, não basta a experiência
de redação de jornal. Ele deve ser um misto
de jornalista, relações públicas e
homem de marketing, com uma ampla visão dos negócios
da companhia, conhecimento do mercado e de técnicas
de gestão, só para citar algumas competências
essenciais.
* Comunicação apresentada no 15º Congresso
Brasileiro de Comunicação Empresarial, promovido
pela Comtexto Comunicação e Pesquisa, realizado
no período de 25 a 26 de maio de 2.000, em São
Paulo.
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* Miguel Jorge é vice-presidente de Assuntos Corporativos
do Banco Santander.