Wilson da Costa Bueno*
O relacionamento com a mídia não é
mais, definitivamente, para amadores. Houve um tempo, não
muito distante, em que cultivar bons amigos na redação,
ser criativo, ter intuição para perceber as
boas oportunidades de divulgação e estar assessorando
um cliente de prestígio contavam muito. Quase sempre,
a somatória destas virtudes era suficiente para se "plantar" uma
boa notícia na imprensa.
Mas as coisas mudaram bastante por estes lados e, hoje, a
disputa por espaço nos principais veículos
brasileiros é
acirrada, em muitos casos dramática. Como há assessorias
competentes por toda a parte e as organizações
(mesmo as menores) estão, gradativamente, buscando
incrementar o relacionamento com a mídia, as assessorias
e os assessores tiveram que se profissionalizar . A intuição,
a criatividade, os bons contatos, o perfil do cliente continuam
ajudando, mas estas competências também são
encontradas nos adversários. Logo, isto só não
basta e, quem deseja levar vantagem, precisa dar um passo
(e que passo!) a mais.
Para complicar o cenário, a imprensa também
se profissionalizou, criou editorias e cadernos específicos
e separa com mais facilidade o joio do trigo, ou seja, as
boas das más pautas. A mídia segmentada (ou
especializada) se consolidou, o jornalismo on line
é uma surpreendente realidade e, dessa forma, o relacionamento
ficou mesmo mais complexo (e bota complexidade nisso!).
O planejamento de um trabalho de assessoria de imprensa
exige, agora, inteligência, conhecimento aprofundado dos veículos
e até dos jornalistas que neles trabalham, tendo em
vista que os espaços autônomos de influência
nos jornais e revistas (comandado por colunistas, por exemplo)
cresceram a olhos vistos. A imprensa, de alguma forma, está loteada
em capitanias e os editores que as receberam dos empresários
da comunicação têm autonomia suficiente
para aceitar ou rejeitar pautas. O dono do jornal , da revista
ou da emissora de rádio têm muitas coisas para
cuidar além dos seus próprios veículos
(pensa que a vida deles também está fácil?)
e são obrigados a compartilhar o poder de decisão.
Negociar com muitas cabeças (e mentes), de culturas
- inclusive jornalísticas- diferentes, é certamente
muito difícil, mas esta é
a tarefa corriqueira dos modernos assessores de imprensa.
Os releases continuam sendo válidos, mas aquele release
padrão que se encaminhava, por fax (de algum tempo
para cá, por e-mail) para as redações,
foram, pouco a pouco, perdendo sua eficácia. Na verdade,
as assessorias já deveriam ter percebido, há algum
tempo, que esta situação cômoda não
iria perdurar muito. O foco dos veículos (e agora
das editorias) varia bastante e para seduzir o Valeparaibano,
a Folha de S. Paulo, a redação local da rede
Globo ou uma rádio AM são necessárias
estratégias distintas que levem em conta a linha editorial,
mas também os interesses e as idiossincrasias de repórteres
e editores. Cada contato, cada release deve ser, por causa
disso, personalizado. Para se acertar na mosca, é preciso
conhecer o tamanho e a posição do alvo.
A comunicação on-line e as novas tecnologias
trouxeram novas exigências ao trabalho de assessoria
de imprensa. Hoje, a resposta tem que ser rápida porque
há muitas fontes disponíveis e a hesitação
no momento de atender
à imprensa pode significar a perda de uma pauta importante.
Mais ainda: o repórter também está pressionado
pelo tempo, sobretudo porque as redações estão
cada vez mais enxutas (há colegas fazendo 3 ou 4 matérias
por dia) e não há como esperar. Há quem
garanta que o processo de produção jornalística
se aproxima, cada vez mais, da arte de fazer pastel: o conteúdo
tem que ter qualidade, mas o óleo também precisa
estar sempre quente. Se o produto não estiver pronto
imediatamente após o pedido do cliente, ele vai comer
(sabia que os jornalistas têm fome de informação?)
no quiosque ao lado. Se gostar, talvez não volte nunca
mais.
A ética inegociável
Embora estejamos atravessando uma grave
crise
ética (não apenas os governos e partidos, mas
a indústria da comunicação - agências
de propaganda, veículos etc andam sob suspeita), a
melhor alternativa é ainda privilegiar a ética
e a transparência nos relacionamentos com a imprensa.
Isto se consegue não com dinheiro mas com caráter,
e
é preciso exigir dos clientes que sejam leais, responsáveis
em todos os momentos. A imprensa muitas vezes comete seus
deslizes (a gente sempre soube disso), mas costuma ser impiedosa
quando se sente traída, ou quando alguém lhe
esconde algo. Não se deve desafiá-la. especialmente
quando o cliente tem, como se diz na gíria jornalística,
rabo preso ou culpa no cartório. Não vale a
pena - mas não vale a pena mesmo - cutucar a onça
com vara curta porque quase sempre o risco de acidentes é enorme.
A assessoria de imprensa tem
hoje, apesar destes desafios imensos, um papel fundamental
a desempenhar. Os meios de comunicação, mais do que em qualquer outra época,
contribuem para formar a imagem das organizações
e devem estar incluídos em todo planejamento de comunicação
empresarial. Viver
à revelia da mídia é impraticável,
ignorá-la
é sinal de falta de inteligência organizacional.
Não há dúvida de que a tarefa tende
a ficar cada vez mais complexa. Novos veículos (impressos
ou on line) surgem a todo momento (as bancas andam mais sortidas
do que as prateleiras de supermercados), os jornalistas tornam-se
cada vez mais capacitados (você já percebeu
como há cada vez mais profissionais de imprensa nos
cursos de pós-graduação?) e o número
de assessorias tende a crescer assustadoramente (são
duzentos cursos de jornalismo no País!) para disputar
palmo a palmo este espaço nobre.
O futuro exigirá que cada assessor de imprensa se
torne um estrategista, um gestor de informação
(e você
achava que só o seu "baita" texto e o seu
faro iriam segurá-lo a vida toda?). A fase romântica
("deixa comigo que eu falo com o colega da redação
e resolvo esta parada") ficou para trás. O bom
jornalismo, o jornalismo
ético (que são os únicos que interessam)
estão a exigir gente competente. Os amadores, que
nos perdoem, mas deverão surfar em outra praia. Esta
aqui, agora, só está aceitando profissionais.
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* Wilson da Costa Bueno é jornalista, professor
do programa de Pós-Graduação em Comunicação
Social da UMESP e de Jornalismo da ECA/USP, diretor da Comtexto
Comunicação e Pesquisa.