Jornalismo ambiental

:: A importância da mídia na conscientização ambiental

Eliana de Souza Lima*

      A comunidade internacional deu passos decisivos para o que hoje poderia ser chamado de globalização dos problemas ambientais, quando há quase oito anos, as atenções do mundo se voltaram para o Rio, onde acontecia a Conferência da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Rio 92. A partir daí, a imprensa começou a noticiar mais sobre meio ambiente. De lá para cá, reportagens e artigos sobre os mais variados assuntos dentro da pauta ambiental vêm sendo publicados e veiculados nas diversas mídias. O meio ambiente é objeto de investigação constante desde então. Hoje, não existe um jornal, seja ele impresso ou eletrônico, que se recuse a noticiar algum acontecimento da esfera ambiental. O meio ambiente é importante demais para que a mídia o ignore. Espero somente que não seja mais um modismo.
      Alberto Dines disse que um dos pilares da tríade interativa das ações jornalísticas é a ética, "porque somos responsáveis pelos efeitos de nosso trabalho e das nossas intervenções no processo." Seria então a mídia responsável pelo aumento de conscientização da população acerca dos problemas ambientais? Eu diria que sim, somado ao esforço contínuo de ONGs ambientalistas e órgãos do governo, preocupados com a devastação do meio ambiente. Contudo, a mídia precisa se conscientizar ela mesma que o que publica ou veicula vai afetar diretamente a vida do cidadão. No entanto, em muitas ocasiões o que é divulgado, seja sobre desastres ambientais ou uma lei que beneficie o meio ambiente, não é vinculado ao dia-a-dia da população. Um exemplo: outro dia uma reportagem de TV mostrava que a represa de Guarapiranga na Grande São Paulo estava sendo urbanizada em sua orla. O repórter falou sobre as construções irregulares, entrevistou os "grileiros" do local e engenheiros; foi à Prefeitura paulistana verificar se realmente aqueles proprietários detinham a posse da terra. Mas se esqueceu de um fator fundamental: a água. Sim, a água da represa, que poderia estar sendo contaminada com o despejo dos esgotos domésticos das construções irregulares que ele noticiava. Acabou a matéria e ele não procurou os órgãos ambientais, como a Cetesb, para realmente averiguar se havia a contaminação da água. A água que o cidadão recebe em sua torneira e que para ser tratada passa por um caro processo, e que, quanto mais suja, mais encarece este processo de limpeza. Onde está a relação com o dia-a-dia da população?

A comunicação pode ajudar a educação

      Os jornais noticiam que falta água, a ausência de chuvas há meses, mas não mostram o desperdício da lavagem diária de calçadas e de carros nos lava-rápidos e postos de gasolina. A mídia precisa conscientizar-se de que ela faz muitas vezes o papel de educador. Que muitos que a leêm e a assistem só possuem este canal para se informar; não freqüentam ou freqüentaram escolas, não têm acesso a livros. São pais que poderiam passar o conhecimento adquirido sobre as questões ambientais para seus filhos, de modo que estes não joguem papel pela janela do carro, contribuindo para entupir os bueiros em épocas de chuva. Quem é que sabe hoje como se faz para tratar a água suja dos rios, a água que bebemos? Muito poucos, com certeza, daí a cultura do desperdício, pois creêm que água limpa e disponível para todos existe em abundância, afinal o Brasil possui muitos rios.
      O jornalista não faz o papel de educador porque lhe falta também uma formação específica no campo educacional e principalmente no científico. Colabora para isso a maneira como funciona ainda, infelizmente, o jornalismo científico no Brasil, que tem sido abordado segundo o vai e vem dos modismos. Durante a Rio 92 e no ano subseqüente, os grandes veículos mantinham setoristas nas dependências do Ibama. Passada a moda, o assunto perdeu espaço. Os cadernos especiais tranformaram-se em seções, e em seguida subseções. Não há, pelo menos no grau que se espera, por parte dos responsáveis pela formação dos jornalistas, uma preocupação com as questões científicas, incluindo as ambientais.

Noticiar meio ambiente também é jornalismo científico

      O jornalismo científico não deve ser entendido como aquele noticiário comum dos jornais, revistas, rádios e estações de TV que, embora centralizados, às vezes, em questões comuns e corriqueiras, não revela o cuidado necessário no trato dos detalhes que se prendem a questões científicas. Como resultado disto, transmite ao público noções falsas e equivocadas, muitas vezes em prejuízo da saúde, do bem-estar e da própria segurança do cidadão em particular e da comunidade em geral. Para a má informação científica, que se constata a cada passo nos veículos de comunicação, contribuem vários fatores, entre os quais julgo que se devem destacar os seguintes, como os mais freqüentes e de maior impacto: 1) Má formação humanística e falta de cultura geral dos formados em cursos de comunicação social; 2) Informação incorreta das fontes; 3) Auto-censura da informação científica; 4) Falta de preocupação pela informação científica. Da constatação de todas estas deficiências da informação científica encontradas na imprensa, incluindo a Internet, concluo que é necessário e urgente dar novo tratamento a tudo o que se refere a conceitos científicos em qualquer órgão de divulgação, principalmente para que a informação científica, como qualquer outra informação, tenha o objetivo não só de informar, mas de formar e colaborar com a melhoria da qualidade de vida da sociedade. Este é um trabalho que não depende exclusivamente do jornalista, mas também de suas fontes de informação, e principalmente, dos que geram a informação científica.

Nem sempre a culpa é do jornalista

      Nota-se que a formação de jornalistas para o mercado de trabalho hoje impõe uma especialização cada vez maior de conhecimentos. Pode-se argumentar que há jornalistas que conseguem comunicar o que os especialistas sabem, mesmo sem nada entender do campo em questão, pois o negócio do jornalista é a comunicação. Mas esses profissionais permanecem na total dependência da orientação de pessoas nem sempre desejosas de contar o que está acontecendo. Muitos erros e deturpações apresentados pelas fontes seriam corrigidos ou mostrados criticamente, se jornalistas tivessem especialização nos setores que cobrem. Aliada às melhores concepções éticas e políticas, a especialização é uma garantia de um jornalismo a serviço da população. Temos inúmeros exemplos em nossa imprensa.
      Uma alta qualificação, que o coloque em reais condições de apurar as informações e avaliar criticamente declarações de suas fontes, é um dos requisitos para aumentar o grau de liberdade e de influência do trabalho do jornalista. Concluindo, acredito que a formação dos jornalistas para o mercado é um trabalho que cabe à universidade. Cabe às escolas de comunicação e de jornalismo parcela significativa no processo de educar jornalistas, mas é preciso reconhecer suas limitações operacionais. Distribuir aos alunos iniciantes nos cursos de jornalismo a ilusão de que a simples freqüências às aulas os transformará em jornalistas do mais alto nível pedido pelo mercado é um ato que só contribui para alimentar insatisfações futuras. As escolas de comunicação e de jornalismo só poderão cumprir dignamente sua tarefa quando estiverem materialmente equipadas e pedagogicamente organizadas a partir de uma concepção de jornalismo ético e de serviço à população.

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* Eliana de Souza Lima é jornalista formada pela PUC Campinas em 1989 e especialista em Jornalismo Científico pela Unicamp em 2000. Desde 1991 exerce a função de assessora de imprensa da Embrapa Meio Ambiente em Jaguariúna, SP e atualmente é Diretora de Eventos da Associação Brasileira de Jornalismo Científico – ABJC, gestão 2001-2002.

 
 
 
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